DÉBORA MISMETTI
EDITORA-ASSISTENTE DE "CIÊNCIA + SAÚDE"
Dois
estudos publicados hoje questionam o conceito já cristalizado de que gordura
extra é sempre sinal de maior risco para a saúde.
O
fenômeno é chamado pelos pesquisadores de paradoxo da obesidade: em certos
casos, os quilos além da conta não indicam perigo e podem até ser protetores.
A
primeira pesquisa analisou dados de 43 mil americanos divididos em grupos
conforme o nível de obesidade e os resultados em testes de colesterol, pressão
arterial e condicionamento físico.
Após
um acompanhamento de cerca de 14 anos, os médicos, liderados por Francisco
Ortega, da Universidade de Granada (Espanha), perceberam que os obesos
considerados saudáveis após os exames tiveram um risco 38% menor do que os não
saudáveis de morrer por qualquer causa. A redução de morte por problema
cardíaco ou câncer foi de 30% a 50%.
O
desempenho desses gordos "em forma" ao longo do tempo foi similar ao
dos magros saudáveis, segundo o estudo, publicado hoje no "European Heart
Journal".
Outro
trabalho, na mesma edição da revista especializada, analisou, por três anos, a
mortalidade de 64 mil suecos com problemas cardíacos (como angina e infarto)
submetidos a um exame de imagem para determinar a saúde de suas artérias
coronárias.
Os
pacientes foram subdivididos de acordo com seu IMC (índice de massa corporal, calculado
dividindo o peso em quilos pela altura ao quadrado, em metros).
O
gráfico de mortalidade ficou em forma de "U": quem estava nos
extremos (muito magros ou obesos mórbidos) tinha risco mais alto de morrer do
que paciente intermediários, com sobrepeso ou obesidade moderada.
De
acordo com o cardiologista Eduardo Gomes Lima, do Hospital 9 de Julho, esses
achados propõem um questionamento ao uso do índice de massa corporal como
método para avaliar obesidade.
"Dizer
que um IMC a partir de 30 significa obesidade é suficiente? Nessa população vai
ter obeso de verdade, mas também uma população com boa condição física, com
muita massa magra. Não dá para colocar o IMC como grande definidor de
prognóstico dos pacientes."
A
pesquisa que acompanhou os americanos credita o melhor condicionamento físico
dos obesos saudáveis como responsável pelo menor risco de morte observado nesse
grupo em relação aos não saudáveis.
De
acordo com o cardiologista Raul Santos, diretor da unidade de lípides do Incor
(Instituto do Coração do HC de São Paulo), os exercícios reduzem o impacto dos
efeitos prejudiciais da gordura.
"O
exercício tem ação anticoagulante, ajuda a dilatação dos vasos e melhora a
resistência à insulina, tendo um efeito contrário ao da obesidade. É melhor ser
um obeso que se exercita do que um magro sedentário."
Para
Santos, no caso do estudo com cardíacos, o efeito protetor conferido aos obesos
moderados é mais difícil de explicar. Uma possibilidade é a de esse grupo ter
pessoas com menos gordura abdominal, que produz substâncias inflamatórias e é
um conhecido fator de risco cardíaco.
"Recomendamos
a quem tem problema cardíaco perder peso, especialmente se a pessoa for
barriguda."
Lima
afirma que não se deve ficar com a impressão de que a obesidade não tem consequências.
"A obesidade mórbida sempre está associada a um prognóstico pior."
Para
ele, o importante é a necessidade de redefinir os limites da obesidade. "Talvez a gente esteja sendo muito rígido nessa
avaliação."
Editoria de
arte/folhapress
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